sábado, 28 de fevereiro de 2009

Um Pedido De Socorro


As portas da sala de trauma se abriram. Era Fernando Castro, o plantonista chefe da noite. Ele foi chamado
para atender UM chamado às três da da manhã. A paciente sofria de bronquite asmática, e o problema seria uma súbita falta de ar.
Ao chegar no trauma, avaliou a paciente, que estava ofegante, com grande quantidade de suor. Suas palavras quase imperceptíveis, saíam de encontro à névoa do oxigênio que
estava recebendo.
__ Calma dona Cirene. Vai ficar tudo bem?__ disse o plantonista, examinando a paciente.
Ela sem conseguir muito dizer, balançava a cabeça em sinal negativo. Sentia fortes dores no peito devido a ausência de ar.
Álvaro Neto estava junto da paciente. Seguia as mensagens do monitor. Avançava frente a tudo aquilo que estava acontecendo. A paciente, por estar com grande
quantidade de suor, acabou perdendo o acesso venoso.
__ Aqui,...ta complicado aqui..__dizia Álvaro Neto tentando achar uma veia naquela pele clara e sudoréica.
Todos estavam perto da paciente, mas ninguém chegou a pensar que algo a mais iria acontecer. todos pensavam que ela iria estabilizar, iria ficar na macronebulização.
No outro dia iria ter alta. E todos ficariam bem. Mas esse algo a mais da vida e essa soberba do acaso, transforma tudo.
Por u,m piscar de olhos, a paciente deu uma piorada. A falta de ar piorou. A angústia pela luta ao encontro do ar é algo assustador. O esforço
do corpo em busca do oxigênio é algo indescritível.
__ Material de intubação..rápido__disse o plantonista!

__ Chama mais gente aqui_dizia Álvaro_ puxa ali o aspirador.
A confusão esta armada.
__ Ta sem acesso...ta sem acesso P*!__disse o médico.
__ Ninguém ta conseguindo, disse uma auxiliar de Enfermagem.
Esse desespero atrai mais ainda a facilidade do erro. Um não escuta o outro que não entende o um.
Álvaro chegou perto, iria tentar um acesso na jugular. A veia do pescoço. Nunca tinha tentado. Eras uma grande oportunidade de começar.
Ao chegar mais perto da paciente, ela girou a cabeça e disse à Álvaro.
__ Me ajuda!
Aquela frase quase que ouvida por leitura labial, trouxe a Álvaro uma difícil tarefa. Voltar ao seu corpo. Ele foi tomado de uma grande insegurança.
Um pedido de Socorro. Este pedido de última hora. Quando não se pode ter mais a ajuda de ninguém, e você é a única solução daquele problema.
Um simples acesso. Uma simples porta para algumas coisas que poderiam salvar aquela vida. Álvaro não conseguiu o acesso.
__ O laringo não está funcionando! disse o médico.
Um grande problema de uma emergência é a manutenção dos equipamentos. É fundamental a quem trabalha neste setor, ter tudo em mãos para trabalhar nesses
momentos cruciais para salvar a vida de alguém.
Dona Cirene morreu vinte minutos depois. Tromboembolismo foi o diagnóstico. MAs o que ficou marcado à Álvaro, foi aquele pedido de socorro que ficou pra trás.
Uma negligência. Omissão. Uma derrota.
Depois desse dia, Álvaro Neto começou a treinar nos pacientes que não tinham mais possibilidades de vida. Aqueles que estavam a dias no leito esperando o
"mensageiro" chegar. Esperavam a morte e Álvaro ia aprendendo a lutar contra ela. Aos poucos a profissão veio trazendo o tato, o odor e a grande sensação
que é ter a essência de ser alguém que vai salvar um outro alguém. Um pedido de socorro ficou marcado em Álvaro Neto.

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Acidente Na Lagoa


A voz metálica entrava no quarto.
__ 04 na escuta.
A equipe entregue ao cansaço, tentava achar o rádio comunicador para atender o chamado.
__ Na escuta.
__ Por favor, prioridade a este atendimento. É uma máxima.
"MÁXIMA". Palavra que significava um atendimento de grande urgência. Risco de vida iminente.
A equipe toda levantou-se em um ritmo único. Álvaro Neto estava começando na equipe. Atendimentos de urgência em uma ambulância
trouxeram muitas experiências à Álvaro Neto.
__ Vambora vambora__ dizia Álvaro Neto já indo para a ambulância.
A equipe já tinha pego com a regulação o endereço do atendimento. Lagoa Rodrigo de Freitas. Ao fundo a árvore de natal. Na pista um acidente
grave com feridos no local.
A ambulância chegou em cinco minutos pela proximidade da base ao local do acidente. Chegando perto, luzes do carro da polícia giravam de
encontro ao da ambulância e pessoas às duas da manhã acompanhavam esse resgate.
__ To descendo_ disse Álvaro Neto saindo da ambulância,com as luvas já vestidas.
A médica veio junto trazendo duas maletas. Enquanto o condutor colocava a ambulância em uma posição estratégica, a médica e Álvaro Neto
chegavam perto do atendimento.
__ Que merda__ disse Álvaro chegando perto do acidente.
Um vectra colidiu de frente com uma fiorino. As duas frentes pareciam uma única coisa. O motorista estava preso dentro do painel. Seus
braços foram subtraídos por uma força mecânica da batida. O motorista da fiorino foi jogadado quatro metros longe do acidente. Uma viatura
do corpo de bombeiros já tinha levado uma vítima do acidente para o hospital Miguel Couto.
__ Olha aqui Álvaro__ disse a médica chegando perto de outra viatuira dos bombeiros.
Álvaro olha aquele corpo pequeno, de uma criana de dez anos, quase que irreconhecível em um banco da viatura dos bombeiros. Os braços
fraturados estavam quase unidos nas pernas. Um orifício
no abdome da criança mostrava alguns orgãos. Logo embaixo do banco uma criança com a perna direita fraturada chorando muito.
__ Calma!__disse Álvaro segurando na mão da criança, quue em virtude da dor não conseguia entender nada.
Agora o que fazer? Em uma situação de estresse intenso. choro, sangue e dor unidos em um acidente que poderia ser evitado.
A equipe 04 dirigiu-se ao ocupante do vectra que estava no banco de trás. Uma lesão clara na clavícula e várias lesóes pelo corpo. Sangue
que escorria pelo rosto e um choro quase que desesperador desse ocupante.
A equipe mobilizou e conduziu à viatura. Todos os cuidados foram prestados na mais rigorosa técnica possível.
A equipe chegou no Miguel Couto e ficaram aguardando neurocirurgião sair da cirurgia para ser avaliado. Enquanto isso Álvaro e a equipe
souberam o que aconteceu um tempo antes do acidente.
Armando, chamou o pai para dar um passeio pela cidade. Iriam ao teatro e depois passear com seu filho e seu sobrinho pela orla. No caminho de
volta, O pai de Armando pediu para pegar na direção, porque Armando estava cansado e poderia dormir no volante. Com isso o pai de Armando,
acostumado a dirigir em alta velocidade, fez ultrapassagens perigosas, em até que uma não controlou o carro e foi de frente com a fiorino.
Ele ficou preso nas ferragens e vai ser difícil para a equipe dos Bombeiros serparar o painel do veículo, o volante e o corpo do seu pai.
O seu filho estava morto no banco do veículo dos bombeiros. No momento do acidente, ele estava no banco de trás e voou em direção ao painel.
Seu sobrinho gravemente lesionado. Sua atual namorada tinha sido transferida também com uma lesão pulmonar grave.
__ Álvaro que merda__ falou em voz baixa a médica à álvaro.
Nesse meio tempo chegou na emergência a ex mulher de Armando, e ao saber da morte do seu filho, o desepero tomou conta daquela mulher.
Seus gritos de choro eram escutados por todo o Rio de Janeiro. Suas lágrimas pareciam de sangue, igual ao do seu filho jogado lá naquele carro
dos bombeiros.
Álvaro sentiu uma dor estranha dentro de si. Chorou. Aquela cena iria ficar marcada na sua mente para o resto da sua vida. Na volta à base,
ele tentou fechar os olhos e dormir, mas só escutava aquela voz da mãe desesperada e a cena da criança em pedaços no banco da ammbulância.
Mais uma dor que ficaria no coração de Álvaro Neto. Mais uma cena desse inferno chamado emergência

Pamé

sábado, 14 de fevereiro de 2009

O Homem Do Jaleco Branco


Aquela manhã chuvosa, deixou várias pessoas ilhadas pela cidade. Não por menos ,qualquer chuva a mais provoca um transtorno
aos moradores. Esse transtorno também chega aos profisisonais que iriam trabalhar no posto de urgência 24h da cidade.
Naquela semana, estavam treinando novos funcionários. Funcionários que foram aprovados em uma
prova de currículos e estavam treinando para conhecer a rotina do hospital.
A Enfermeira Andréia, supervisora do plantão, passou para checar a presença dos funcionários.
__ Olá..tudo Bem? Como estamos?
Alguma parte do plantão já havia chegado. Também presente, havia um rapaz escuro de aproximadamente
um metro e setenta, olhos bem escuros, bem arrumado, com um jaleco branco com o logotipo da instituição
Os técnicos apresentaram o rapaz à supervisora.
__ Andréia, você poderia me dar um minuto_ disse a técnica Cláudia a mais antiga do plantão.
As duas foram para fora da emergência.
__ Diga Cláudia_ disse Andréia tirando seu cigarro do jaleco.
__ Esse rapaz que esta treinando é muitro estranho.
Colocando o cigarro na boca, Andréia bate com os ombros.
__ Não entendi..estranho o que? Feio?
__ Não..não..ele é caladão..não pergunta nada, fica ali sentado só olhando.
As duas continuam caminhando e Claúdia continua:
__ E tem mais, ele fica tremendo..ainda por cima veio depois da farra pro plantão..repara só!
__ Então já vi que ele nem vontade para querer aprender ele quer né?
__ Não sei..ele até agora nem uma medicação quis fazer. Nem sequer ajudou a segurar
a criança para fazer uma medicação.
Andréia apagou o cigarro, segurou nos braços de Cláudia e disse:
__ Vamos lá ver o menino.
As duas entraram na emergência e lá estava o rapaz sentado olhando para todos os lados. Suas mãos juntas no colo, raspavam entre si, em
um sinal claro de ansiedade.
Andréia chegou perto do rapaz.
__ Ola meu querido ..você já trabalhou em emergência?
Sem olhar para Andréia ele disse:
__ Já..já_ disse o rapaz sem dar muita atenção.
Andréia achou algo estranho nele. Mas resolveu dar um trabalho para ele.
__ Tem uma medicação para fazer naquele senhor que esta na fila. Ele esta com a ficha na mão. você pode fazer?
O rapaz levantou sem responder. Pegou a ficha de medicação. Olhou de um lado, girou a ficha para o outro. Deixou ela no balcão e voltou a
sentar.
Andréia furiosa, vendo que o senhor estava esperando a medicação e o rapaz acabará de deixar a ficha no balcão e sem dar alguma explicação
senta de novo no seu banco com as mãos cruzadas no colo.
__ Pera ai..eu te pedi para você fazer a medicação ..por que não fez?
O rapaz mantendo o olhar reto, balança a cabeça para a esquerda, em sinal de "não sei".
Andréia levanta o rapaz e o leva para a chefia.
Chegando na parte administrativa, Andréia abre a porta e entra com o rapaz. A chefe olhando para Andréia e para o rapaz sorridente com o
jaleco vestido
levanta e diz para o rapaz.
__ Maurício..o que você está fazendo com esse jaleco?
__ Não sei.__responde Maurício.
Andréia olhando sem saber o que estava acontecendo diz:
__ Oh chefe..ele veio treinar e não faz nada e a senhora ainda pergunta porque ele esta de jaleco?
A chefe de Andréia ri e aponta para Maurício.
__ Ele é paciente do médico rogério, psiquiatra_ diz a chefe de Andréia.
__ Mas como ele está de jaleco..no posto de enfermagem. pronto para trabalhar..fazer medicação...
A chefe olha para Andréia e diz.
__ Eu que te pergunto_ disse para Andréia e segue agora falando com Maurício__ e você rapaz já estava aprontando de novo né.
Maurício foi encaminhado ao ambulatório onde teria uma consulta com o seu médico. Em um de seus delírios, Maurício foi um grande cirurgião
plástico.
É, isso é uma das coisas que já aconteceram nesse inferno chamado emergência.




Pamé

sábado, 7 de fevereiro de 2009

O Mensageiro


Álvaro esperava a rendição. Na porta da emergência escutou a funcionária do CTI chama-lo.
__ Álvaro...dá um pulinho aqui.
Álvaro entrou no CTI.
__ Você pode dar uma olhadinha aqui, enquanto eu tomo café?
__ Tranqüilo ..vai lá_ respondeu Álvaro.
O CTI tinha 6 leitos. Mas um estava vazio. Outros 4 estavam intubados. Não podiam falar.
Somente um paciente estava interagindo. Anselmo. Menino de 17 anos que sofreu um acidente de carro e estava
paraplégico. Uma de suas vértebras se tornou pó após um capotamento na BR.
__ Oi..Enfermeiro...como está o tempo?
__ Acho que vai fazer sol...ta precisando..disse Álvaro chegando perto do leito!
__ To doido pra ver o sol..estou aqui já faz um tempo..
__ Pede pro pessoal te levar na cadeira de rodas.você já esta com o colete..ai é tranqüilo.. e vai ser até
bom para você__ Álvaro não conseguiu terminar a conversa, seu telefone toca.
__ Pêra ai rapidinho que vou atender aqui.
__ Tranquilo_ disse anselmo.
Álvaro sai do CTI ficando somente na porta, não mais que 2 minutos, volta perto do leito de Anselmo. Já
com o rosto diferente de minutos antes, Anselmo mostra-se agitado e ansioso.
Seus olhos caminham pelo teto do CTI. Abertos correm para o canto do seu leito.Seu corpo reagindo a algo,
contorce como se fugisse de algo que estava perto demais tentando destruí-lo.
__ Sai daqui__ disse Anselmo em voz alta.
Álvaro assustado, procura alguém perto do leito, mas era impossível. Ele estava ali na porta e ninguém
poderia ter entrado. Sinais estáveis no monitor.
__ Eu já te disse...não adianta falar nada..eu não quero saber..não;..fique longe de mim_ dizia Anselmo se
contorcendo no leito.
__ Anselmo..o que foi isso??? O que esta acontecendo..?
Anselmo olha para Álvaro e com uma voz tremula diz à Álvaro.
__ Você não está vendo?
__Quem Anselmo..está de brincadeira?
Anselmo olha para o lado direito. Estica o dedo. E fala
__ Esse homem de capa preta do meu lado.
Álvaro olha para o lado e não vê nada. O CTI vazio. Ninguém poderia ter entrado e muito menos se tivesse
entrado, poderia ter visto nesse momento.
Álvaro caminha para trás. Seu telefone toca. Enquanto fala ao telefone, ainda escuta Anselmo falar.
__ Não..não..eu não quero ir. Não adianta..você não pode fazer isso..eu não acredito em você..nãooo.
Álvaro desliga o telefone e percebe um silêncio.
Anda até o box de Anselmo,caminha devagar, passa pelo leito vazio, passa pelo leito de uma mulher,
Chega ao leito de Anselmo e repara logo no monitor que faz uma reta.
Parada cardiorespiratória.
Álvaro corre e pede para chamarem um médico. Seu olhar depara-se com aquele corpo inanimado. Um olhar
perdido. Uma lágrima corre pelo rosto de Anselmo. Um frio corre pelas pernas de Álvaro. Aquela manhã trouxe algo de novo
para essa experiência de vida.
Os médicos constataram o óbito. Álvaro foi rendido e começou o caminho de volta para casa. Não comentou
com ninguém sobre o fato.
No caminho de volta para casa, com sono, cansado e pensativo, sua mente se distrai várias vezes. Abre bem
os olhos. Pára o carro no primeiro lugar que poderia comprar uma garrafinha de água gelada.
Seu pensamento ficava preso em Anselmo. Descobriu que a morte tem um mensageiro. De um jeito ou de outro.
Acreditem ou não. Só duas pessoas poderiam descrever o que aconteceu: um seria Anselmo a outra é Álvaro Neto.

Este é Pamé, nosso artista que vai retratar todas as histórias.